InforMEI – Considerando a crise econômica global em 2020, a atividade de P&D, as operações de capital de risco e a determinação política de promover a inovação também sofrerão impacto negativo?

Sacha Wunsch-Vincent – A pandemia desencadeou uma paralisação econômica global sem precedentes. A crise atual atingiu o cenário de inovação em um momento no qual a inovação estava florescendo. Como o IGI 2020 mostra, os gastos globais com P&D cresceram em ritmo mais acelerado que o da economia global em 2018. As operações de capital de risco e o uso da propriedade intelectual estavam no auge e tem sido observada uma forte determinação política de promover a inovação, inclusive em países em desenvolvimento. Como a inovação será impactada no contexto econômico atual é uma questão muito pertinente. Considerando que a inovação se tornou um elemento central da estratégia das empresas e das estratégias nacionais de crescimento econômico, espera-se que a atividade inovadora não sofra uma queda tão profunda quanto se pressagia.

Soumitra Dutta – A pandemia não mudou o fato de que ainda há um enorme potencial para o surgimento de tecnologias disruptivas e para a inovação. Na verdade, a crise provocada pela pandemia pode catalisar a inovação. Importantes empresas e investidores em P&D estão usando a inovação para garantir sua competitividade em setores especializados no futuro, como nos de TI, dos produtos farmacêuticos ou de biotecnologia.

InforMEI – Quais outros setores deveriam se adaptar rapidamente a esse novo cenário e como deveriam financiar seus gastos com inovação?

Sacha Wunsch-Vincent – Setores tradicionais, como turismo, educação e varejo, precisarão usar a inovação para se adaptar e garantir competitividade no futuro. Outros setores-chave, como o de transportes, precisarão se adaptar mais rapidamente, já que há um interesse renovado na busca por energia limpa. A reorganização do trabalho nas empresas e no nível individual, além da reorganização local e global da produção, também exigem inovação. O apoio governamental será necessário para liberar esse potencial, bem como modelos colaborativos e investimentos contínuos do setor privado em inovação.   

InforMEI – A esta altura, seria recomendado que os governos aumentassem investimentos em inovação, mesmo em um cenário de dívida pública alta?

Soumitra Dutta – Sim. Com exceção do setor de saúde, observamos que, nos atuais pacotes de estímulo, muitos governos não consideraram a inovação e a P&D como uma prioridade para amortecer o impacto do arrefecimento econômico e enfrentar a recessão que se aproxima. Seria prudente que as lideranças tomassem medidas concretas na transição da contenção para a recuperação no sentido de liberar o potencial inovador das empresas e de promover investimentos do setor privado em inovação. Uma vez que a pandemia esteja sob controle, é crucial que o apoio à inovação se amplie e que ele seja oferecido de uma maneira anticíclica – ou seja, à medida que os gastos das empresas com inovação caem abruptamente, os governos devem se esforçar para neutralizar esse efeito aumentando seus gastos com inovação, mesmo diante de um contexto de aumento da dívida pública.

Sacha Wunsch-Vincent – O IGI 2020 mostra que uma combinação de políticas cuidadosamente concebida é essencial para melhorar o cenário do financiamento à inovação nos países. Os governos podem desempenhar um papel importante no sentido de reduzir os riscos para investimentos em tecnologia e envidar esforços concretos para desenvolver mercados de capital de risco vibrantes. São necessárias políticas que permitam que os mercados financeiros se tornem mecanismos de estímulo à inovação, principalmente em economias em desenvolvimento e emergentes.

InforMEI – Diante de um cenário de queda acentuada nas operações de capital de risco na América do Norte, na Ásia e na Europa, como os senhores veem a recuperação desses mercados e o que esperam dos grandes polos de capital de risco nos próximos anos?

Soumitra Dutta – A crise reforçou a queda nas operações de capital de risco iniciadas antes da pandemia. As operações de capital de risco vêm caindo acentuadamente na América do Norte, na Ásia e na Europa. No entanto, há alguma esperança. É provável que os maiores polos de capital de risco – como Singapura, Israel, China, Hong Kong, Luxemburgo, Estados Unidos, Índia e Reino Unido –, se recuperem rapidamente, em parte devido à sede pelo retorno sobre capital investido em todo o mundo.

Saúde, educação a distância, big data, e-commerce e robótica são as novas direções do capital de risco e da inovação. A conjuntura econômica atual suscita uma série de questões relacionadas à evolução no que diz respeito ao financiamento à inovação no curto e no longo prazo. Nesse cenário de incertezas, políticas que estimulem investimentos e inovação e promovam a consecução de objetivos de longo prazo serão fundamentais para o crescimento econômico e o bem-estar das pessoas no futuro.

InforMEI – A geografia da inovação continua mudando. Após tantos anos à frente do IGI, quais são as principais apostas para a próxima década?

Sacha Wunsch-Vincent – Nos últimos dez anos, observamos que diversos países emergentes e em desenvolvimento assumiram um papel mais central no cenário global da inovação. A geografia da inovação está se deslocando na direção da Ásia, que vem desempenhando um papel cada vez mais crucial nessa área a cada ano. A China oferece o exemplo mais claro desse fato, tendo se classificado na 14ª posição no IGI pelo segundo ano consecutivo, e que continua a ser a única economia de renda média classificada entre as 30 de melhor desempenho no IGI.

Ao longo dos anos, China, Vietnã, Índia e Filipinas são as economias que mais galgaram posições nas suas classificações de inovação no IGI. Todas fazem parte do grupo das 50 economias mais bem classificadas atualmente. 

Economias de alta renda continuam ocupando os primeiros lugares globais no IGI, em várias facetas da inovação. No entanto, em indicadores de inovação selecionados, economias em desenvolvimento se destacam: a Tailândia se classificou na 1ª posição em P&D empresarial globalmente; a Malásia é líder mundial em exportações de alta tecnologia; Botsuana se classificou em primeiro lugar em gastos com educação globalmente; Moçambique lidera em investimentos; e o México é o maior exportador de produtos criativos do mundo.

Já a África subsaariana continua a ter o maior número de economias com desempenho em matéria de inovação acima da expectativa para seu nível de desenvolvimento.

Índia, Quênia, República da Moldávia e Vietnã detêm o recorde de desempenho em matéria de inovação acima das expectativas por 10 anos consecutivos.

Soumitra Dutta – É importante lembrar que a maioria das economias que galgaram posições na sua classificação no IGI ao longo do tempo foram fortemente beneficiadas pela sua integração a cadeias de valor e redes de inovação globais. Espero que nos próximos anos mais economias emergentes e de renda média continuem a galgar posições nas classificações do IGI. Isso só acontecerá se elas continuarem a priorizar a inovação como estratégia de longo prazo para o desenvolvimento econômico.