Os desafios jurídicos da pandemia e as expectativas para 2021

por Cassio Augusto Borges

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EDIÇÃO 13 - DEZEMBRO 2020
imagem de uma médica utilizando várias máscaras representando a luta contra o corona vírus

 

 

Os desafios impostos pela pandemia do novo coronavírus neste ano foram sentidos em todas as camadas da sociedade, com a perda de milhares de vidas e empregos e o fechamento de outras tantas empresas.

De positivo, a resposta dada pelo Direito. Enquanto instrumento de promoção da ordem social, foi capaz de se ajustar tempestivamente às novas necessidades, a exemplo das Leis 14.010 (Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia do Covid-19) e 14.020 (Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda), bem como de centenas de atos legais e infralegais editados nos três níveis da Federação.

A nova ordem jurídica foi bem acolhida pelo setor produtivo, que evitou tragédia maior ao preservar empregos.

O Poder Judiciário também fez a sua parte. Entregou Jurisdição célere nos meses em que os desafios e os receios atingiram picos de maior intensidade.

No Supremo Tribunal Federal (STF), o aumento do número de processos apreciados em 2020 pode ser atribuído à sistemática introduzida pelas sessões plenárias virtuais. Pensado inicialmente para limitadas classes de ações, o julgamento virtual sofreu alterações regimentais em 2020, permitindo que todos os processos da competência do Plenário e das Turmas do STF, a critério do relator, pudessem ser decididos de forma remota.

Dos 41 processos da Agenda Jurídica da Indústria – publicada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) – julgados ou encerrados em 2020, 28 o foram por meio dessas sessões virtuais. Não se pode negar que o aumento exponencial dos processos julgados se deve a essa nova sistemática de julgamento.

Dos processos dessa Agenda, 35% deles foram julgados ou concluídos no período de um ano, número que impressiona quando comparado com os processos julgados nos anos anteriores: 14% em 2019, 20% em 2018, 9% em 2017 e 10% em 2016.

A CNI atuou nos momentos mais difíceis, orientando e apoiando as indústrias e a sociedade de modo geral. Constitucionalmente legitimada para atuar no STF, esteve presente nas principais discussões judiciais de 2020, colaborando com resultados positivos alcançados.

Neste mês de dezembro, o STF julgou parcialmente procedente o pedido da CNI na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.931, impedindo que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional torne indisponíveis os bens de devedores sem prévia autorização judicial. Para tanto, a CNI argumentou que essa iniciativa estatal violava os princípios da separação de poderes, do devido processo legal, da propriedade e da razoabilidade, uma vez que a lei que a autorizava não impunha qualquer limite ao poder regulamentar delegado ao órgão fazendário.

Mas o destaque do STF em 2020 fica por conta dos julgamentos das questões trabalhistas, as quais contaram com a participação da CNI como amicus curiae.

Em abril, o STF indeferiu pedido que pretendia suspender os efeitos da Medida Provisória 936/2020 (convertida na Lei 14.020/2020), que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispunha sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública decorrentes do novo coronavírus (ADI 6.363).

Em junho, a Corte confirmou a validade irrestrita da terceirização disciplinada na reforma trabalhista promovida em 2017, julgando improcedentes as ADIs 5.685, 5.686, 5.687, 5.695 e 5.735.

Também em junho, o ministro Gilmar Mendes suspendeu o julgamento de todos os processos em curso na Justiça do Trabalho, que envolvam a discussão da aplicação da TR ou do IPCA-E, como índices de correção monetária (ADC 58).

Faltou ao STF julgar as ADIs 5.826, 5.829 e 6.154, que discutem a validade do contrato de trabalho intermitente previsto pela reforma trabalhista de 2017. O julgamento começou em dezembro, mas foi suspenso após pedido de vista da ministra Rosa Weber. Até o momento, foram proferidos 3 votos, com os ministros Nunes Marques e Alexandre de Moraes votando pela validade desta modalidade de contrato e o ministro Edson Fachin (relator) em sentido contrário. Não há previsão de quando o julgamento será retomado.

A confirmação da validade dessa modalidade de contrato de trabalho assume maior relevância diante da pandemia e dos dados históricos de desemprego, cuja taxa ultrapassou 14% ao fim do mês de novembro. É imperioso que formas alternativas de contratação sejam permitidas e repercutam positivamente na economia. O trabalho intermitente é uma forma de dignificar pessoas, trazendo para a formalidade as que se encontram à margem do mercado de trabalho.

É preciso que em 2021 o STF mantenha o ritmo das suas entregas, pois a duração razoável do processo é um direito fundamental assegurado pela Constituição. Por outro lado, a celeridade não pode atropelar os igualmente fundamentais direitos de defesa e contraditório. O desafio está justamente em alcançar o equilíbrio entre esses direitos, de modo que a Jurisdição seja a um só tempo célere e justa, capaz de ponderar os distintos interesses.

De sua parte, confiante na recuperação da economia e na superação da mais grave crise enfrentada pela atual geração, a CNI seguirá a sua missão na busca de resultados favoráveis à indústria e à sociedade.

 

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Cassio Augusto Borges é Superintendente Jurídico da CNI

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