Acesso a crédito para pequenas e médias empresas

por Christina Aires Correa Lima

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EDIÇÃO 11 - JULHO 2020
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MP 975/20 - Programa Emergencial de Acesso a Crédito - Desburocratização e acesso a recursos para pequenas e médias empresas - Apoio da CNI.

I – OBJETO

1Trata-se de pedido para análise jurídica da Medida Provisória nº 975 (MPV), editada no dia 2/6/2020, que institui o Programa Emergencial de Acesso a Crédito com o objetivo de facilitar o acesso ao crédito pelas empresas de pequeno e médio porte por meio da disponibilização de garantias. Eis um resumo do texto:

“Institui o Programa Emergencial de Acesso a Crédito com o objetivo de facilitar o acesso a crédito a empresas de pequeno e médio porte por meio da disponibilização de garantias.

Alcança empresas com faturamento anual entre R$ 360 mil e R$ 300 milhões.

Segundo a Exposição de Motivos, a garantia do Fundo Garantidor para Investimentos (FGI) cobrirá 80% do financiamento. Esse é o percentual máximo previsto no Regulamento do FGI.

Prevê aporte da União ao FGI no valor de R$ 20 bilhões. Valores não utilizados até 31/12/2020 para garantia das operações ativas serão devolvidos à União.

Os riscos de crédito assumidos por instituições financeiras autorizadas a operar pelo Banco Central do Brasil, incluídas as cooperativas de crédito, serão garantidos direta ou indiretamente.

As operações de crédito poderão ser formalizadas por meio de instrumentos assinados digitalmente ou eletronicamente.

A cobertura pelo FGI da inadimplência suportada pelo agente financeiro será limitada a até 30% do valor total liberado para o conjunto das operações de crédito.

Até 31 de dezembro de 2020, os agentes financeiros ficam dispensados de observar as seguintes disposições:

- Certidão trabalhista do art. 362 da CLT (art. 362, § 1º, da CLT);

- Certidão de Quitação Eleitoral (art. 7º, § 1º, IV, do Código Eleitoral)

- Certificado de Regularidade do FGTS (art. 27, caput, "b" e "c", da Lei nº 8.036/1990; e art. 1º da Lei nº 9.012/1995)

- Certidão Negativa de Débito (art. 47, I, "a", da Lei nº 8.212/1991; e art. 10 da Lei nº 8.870/1994);

- Certidão Negativa de Débito do INSS (art. 10 da Lei nº 8.870/1994)

- Quitação de débitos relativos ao Imposto Territorial Rural - ITR (art. 20 da Lei nº 9.393/1996);

- Inscrição no Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal Cadin (art. 6º da Lei nº 10.522/2002 e art. 62 do Decreto-Lei nº 147/1967.

A garantia concedida pelo FGI não implica em isenção dos devedores de suas obrigações financeiras, os quais permanecem sujeitos a todos os procedimentos de recuperação de crédito previstos na legislação.

Na cobrança do crédito inadimplido não se admitirá, por parte dos agentes financeiros concedentes do crédito, a adoção de procedimentos para recuperação de crédito menos rigorosos do que os procedimentos usualmente empregados em suas próprias operações de crédito.

O Pronampe, programa de crédito para as micro e pequenas empresas instituído pela Lei 13.999/2020, poderá contar com garantia do FGO em até 100% da operação garantida. O percentual anterior era de 85%.”

 

II – ANÁLISE

II.a) Análise formal

2Não se observa vício de constitucionalidade formal na Medida Provisória em análise, que atende os requisitos da relevância e urgência previsto no caput do art. 62, da CF, tendo em vista a necessidade de facilitação de crédito para auxílio das empresas e preservação dos empregos, em razão dos graves efeitos econômicos decorrentes das medidas de isolamento social decretadas no país, que determinaram o fechamento das atividades produtivas, à exceção daquelas que são essenciais, em virtude da pandemia do Coronavírus.

3A MPV também tem amparo na alínea d, inciso I do art. 62, que excepciona da vedação de medidas provisórias sobre planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, na hipótese do art. 167, § 3º, da CF. Este dispositivo admite a abertura de crédito extraordinário, via medida provisória, para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública.

4No caso, a calamidade pública foi reconhecida no Decreto Legislativo nº 6, de 20/3/2020.

5Por fim, a MPV não concede garantias por entidades públicas. Portanto, não incide a reserva de lei complementar exigida pelo art. 163, inciso III, da CF, não se enquadrando nessa previsão o aumento de recursos pela União para o FGI, como faz a MPV no art. 2º, § 3º, inciso I.

 

II.b) Mérito

6No mérito, não há inconstitucionalidade na MPV e, salvo melhor juízo da área técnica e econômica, esta merece apoio da CNI para conferir efetividade ao acesso das pequenas e médias empresas aos créditos abertos pelo Poder Público, durante o período crítico de isolamento social, com a decretação de calamidade pública, para aumentar o capital de giro das empresas, visando a sua preservação e dos empregos dela dependentes, como coloca a exposição de motivos.

7O escopo da MPV é tentar desburocratizar e injetar recursos em fundo garantidor de crédito para pequenas e médias empresas (FGI, que é administrado pelo BNDES), pois foi constatado que os recursos disponibilizados por programas governamentais para superar a crise econômica que emergiu do covid-19 não estão sendo acessados, devido à dificuldade das empresas em prestar as garantias bancárias exigidas para a obtenção dos financiamentos.

8O FGI complementa as garantias bancárias exigidas para a realização de empréstimos, compartilhando o risco assumido pelo banco. No caso de inadimplência, o fundo cobre parte da dívida.

9Para tanto, a MPV altera a Lei nº 12.087/2009 (que trata da participação da União em fundos garantidores de risco de crédito para micro, pequenas e médias empresas e para produtores rurais e suas cooperativas), aumentando o aporte para esse fundo (em até 20 bilhões de reais) por ato do Ministro da Economia. Também desburocratiza seu acesso, com a dispensa de certidões.

10As demais alterações na Lei nº 12.087/2009 – tratando do reescalonamento de prazos de vencimentos de prestações, com ou sem cobranças de encargos adicionais, renegociações com deságio, e outras medidas que buscam facilitar a recuperação do crédito sem comprometer o funcionamento das empresas – nos parecem razoáveis e sem óbices jurídicos, mas a avaliação mais precisa deve ser feita pelas áreas técnicas e econômicas, que detém expertise na matéria.

 

III – CONCLUSÃO

11Não há inconstitucionalidade na MPV, que busca desburocratizar e injetar recursos em fundo garantidor de crédito para pequenas e médias empresas (FGI), pois foi constatado que os recursos disponibilizados por programas governamentais para superar a crise econômica que emergiu do covid-19 não estão sendo acessados devido à dificuldade de prestar as garantias bancárias exigidas.

12O apoio à MPV que, em princípio, se coaduna com as propostas da CNI de suporte creditício às empresas para superar a crise econômica ocasionada pela pandemia do novo coronavírus, depende da oitiva das áreas técnica e econômica.

 

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Christina Aires Correa Lima é advogada da CNI

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