Flexibilidade nas relações de trabalho é fator-chave para atrair investimentos

Ex-vice-ministro do Trabalho da Itália, Michel Martone, relata como a insegurança jurídica e o elevado custo do trabalho decorrentes de leis trabalhistas rígidas resultaram na fuga de empresas do país

O Brasil deve aproveitar este ciclo de crescimento sustentado para flexibilizar as suas leis trabalhistas e como forma de melhorar a competitividade da economia. Em entrevista ao Portal da Indústria , o ex-vice-ministro do Trabalho da Itália, Michel Martone, relata como a insegurança jurídica e o elevado custo do trabalho decorrentes de leis trabalhistas rígidas resultaram na fuga de empresas do país, nos últimos 20 anos. Confira os principais trechos:

Portal da Indústria – Como compatilibilizar a flexibilização das normas trabalhistas e a proteção ao direito do trabalhador?

Michel Martone – É preciso compreender que, para proteger os cidadãos e assegurar os seus direitos, é preciso antes gerar riqueza. E para se ter empregos, a iniciativa privada é necessária. Alcançar o complexo equilíbrio entre normas flexíveis e com a calibragem do direito trabalhista pode resultar no fortalecimento e maior competitividade da economia. Alguns países na Europa sacrificaram oportunidades em nome de assegurar alguns direitos trabalhistas. Mas o importante para o país é gerar oportunidades para que possa crescer economicamente.

Direitos em demasia podem gerar grandes déficits públicos, situação que tive de enfrentar como vice-ministro do Trabalho no governo tecnocrata de Mario Monti. Para enfrentar a crise e combater a especulação, tivemos que aprovar uma dura reforma previdenciária. O que espero para o Brasil é que encontre esse equilíbrio, que chamamos de “flexi-seguridade” sem gerar um grande déficit público, mas gerando riqueza e distribuindo-a.

Portal da Indústria – O que o Brasil pode aprender com a experiência italiana nas relações do trabalho?

Martone – Que o Brasil não cometa os mesmos erros nossos, cometidos sobretudo nos últimos 20 anos. Um país pode promover uma reforma em tempos de calmaria para dinamizar a economia ou se pode promover uma reforma para estancar uma crise. Nesse caso, o remédio pode ser amargo. É em tempo de crescimento que se deve ampliar a produtividade, para pensar na competitividade porque há riqueza para integrar as camadas da população mais pobres à economia. O que o Brasil pode aprender com a Itália é buscar uma maior flexibilidade nas relações do trabalho e enfrentar essa questão logo. Essa é a hora de fazer reformas.

Portal da Indústria – A flexibilidade é muitas vezes confundida com redução de direitos. Como normas mais flexíveis podem ser benéficas para o trabalhador?

Martone – Primeiro é preciso reconhecer a importância do capital humano. O que está acontecendo no mundo é o que o estado de bem-estar social que prevaleceu na Europa gerou elevados déficits públicos que precisaram ser revertidos. E do que consiste esse bem-estar social? Em muitos casos, isso depende das empresas. Se uma companhia é competitiva e cresce, ela pode conceder mais benefícios para seus empregados, como melhor plano de saúde. Isso só pode ser assegurado num contexto de crescimento. Ou pode-se optar por garantir esses benefícios pela rigidez da lei. O que noto no Brasil é que ainda há uma grande desigualdade, o que torna mais importante ainda ampliar as oportunidades de emprego para que se conquiste esses benefícios pela livre negociação, e menos pela aprovação de leis.

Portal da Indústria – Como as normas trabalhistas país afetam a disposição de empresas de investir e gerar empregos num determinado país?

Martone – A experiência italiana mostra que empresas deixam o país quando podem encontrar leis do trabalho mais flexíveis em outros lugares onde é mais fácil produzir. Outro fator importante é a falta de segurança jurídica. O que é muito ruim para as empresas é não saber se uma convenção coletiva celebrada com seus empregados será respeitada na Justiça. Isso é muito importante na atração de investimentos. Se o Brasil cuidar desses dois aspectos, poderá evitar que ocorra o mesmo quadro de fuga de investimentos pelo qual passou a Itália.

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