Um caminho de desenvolvimento chamado bioeconomia

Leis em vigor prejudicam investimento em pesquisa e inovação na área de bioeconomia

O Brasil está diante de um mundo de possibilidades socioeconômicas e precisa acordar e estar preparado para isso: essa é a conclusão dos participantes do primeiro Fórum de Bioeconomia do país, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria com a Harvard Business School (HBS) em São Paulo nesta quinta-feira (4). Pela manhã, cerca de 200 empresários estiveram reunidos para discutir como o Brasil pode ser um líder mundial no campo da bioeconomia acessando legalmente e fazendo o uso sustentável da sua biodiversidade para criar novos produtos e serviços que beneficiam a sociedade e o crescimento do país.

Inovações genéticas
Para Juan Enriquez, fundador do Projeto de Ciências da Vida da HBS e coautor  do conceito de bioeconomia, estamos diante de uma segunda revolução de códigos. Segundo o pesquisador, depois de meio século 20 baseado no desenvolvimento do código binário, sistema formado pelos numerais 0 e 1 que baseia toda a linguagem de programação de computadores, nos anos 2000 a era do código genético é inaugurada. “ Nos últimos 30 anos, os países que ficaram ricos são aqueles que entenderam o valor do primeiro código. Agora isso vai se repetir: quem entender o valor estratégico do DNA vai dominar as tecnologias baseadas nas ciências da vida”, explicou Enriquez.

O especialista se refere a uma indústria baseada nas inovações genéticas que podem ser viabilizadas pelo deciframento do DNA: “Já somos capazes de entender a diferença genética entre uma flor e uma laranja, entre você e a pessoa sentada ao seu lado. Então já podemos copiar criaturas sabendo qual é o seu código da vida, mudar esse código e fazer o que nos interessa”. Dos exemplos citados por Enriquez para ilustrar as possibilidades dessa indústria bioeconômica, destacam-se a criação de dentes, órgãos e outras partes do corpo humanos, como orelhas e vasos sanguíneos, a partir de células geneticamente modificadas. “A medicina regenerativa pode salvar a vida de pessoas que têm câncer e outras doenças”, defende o cientista.

Segundo Enriquez, empresas globais, como a DuPont e a Toyota, e a indústria de cosméticos já investem em inovações genéticas que têm revolucionado o mercado. Roupas capazes de acelerar o metabolismo, algas que absorvem petróleo derramado no ar e combustíveis verdes, como Etanol produzido no Brasil, são exemplos de produtos que derivam do investimento em bioeconomia. Sobre os desafios que o Brasil tem pela frente no campo da bioeconomia, o cientista ressaltou a necessidade de incentivar e investir em indústrias e instituições de ensino: “0,2% do PIB dos EUA investidos em capital de risco nessa área geram 11% dos empregos e respondem por 21% do PIB dos Estados Unidos hoje. O Brasil também precisa avançar nesse sentido”.

O futuro é agora
Para Rodrigo Martinez, coautor do conceito de bioeconomia e também fundador do Projeto de Ciências da Vida da HBS, a bioeconomia é uma plataforma sobre a qual várias indústrias, conhecimentos e áreas econômicas convergem e é um conceito tão transversal que, no futuro, será obsoleto. “Em 50 anos ou menos, todas as pesquisas, matérias-primas e tecnologias serão tão diretamente relacionadas à bioeconomia que não fará sentido usar esse nome; a bioeconomia será a própria economia, território onde todas essas relações vão acontecer”, afirmou Martinez.

O especialista concorda com Juan Enriquez em relação à transição de uma revolução digital para uma revolução biológica: “50% dos produtos que entraram no mercado entre 2010 e 2011 eram digitais e foram desenvolvidos com ferramentas digitais. A perspectiva é que, já em 2012, esses novos produtos sejam uma mescla de analógico e digital”.

Biorrevolução – O investimento em bioeconomia é a chave para o desenvolvimento de novas tecnologias que podem mudar a maneira como homem se relaciona com doenças, catástrofes naturais e com o seu próprio corpo, segundo Martinez. O especialista falou sobre o desenvolvimento de bactérias resistentes à micro-organismos que provocam doenças, sementes resistentes a pragas e outros produtos geneticamente inovadores. “Já é possível produzir um creme com o seu próprio DNA e obter os benefícios regenerativos dessa tecnologia”, lembrou o professor.

Para o representante de Harvard, o boom que o Brasil viveu com o concreto no passado vai acontecer de novo no país com biomateriais num futuro próximo. Mas para chegar a esse momento, é fundamental que o país promova a integração de saberes em universidades e indústrias. “Também é essencial pensar em uma bioplataforma, em um território derivado da bioeconomia que abriga a tecnologia produzida a partir do patrimônio genético do país, e não simplesmente imaginar produtos específicos”, concluiu Martinez.

Desafios
“Quando vejo o volume de incentivos que a indústria automobilística recebe, penso que parte deles poderiam estar aplicados numa economia que gera benefícios sociais a todos” - Para Pedro Passos, co-presidente do conselho de administração da Natura e Líder da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI/CNI), as empresas, centros de pesquisa e universidades que atuam na exploração sustentável da biodiversidade brasileira precisam ter mais incentivos e serem resguardas por um marco regulatório eficiente. “É essencial que esses recursos naturais sejam manejados de forma sustentável e percebidos como uma plataforma pra pesquisa, desenvolvimento e inovação”, defendeu o executivo.

Para Pedro Passos, a riqueza da biodiversidade brasileira – que sozinha detém 22% de todas as espécies de plantas existentes no mundo - deve ser vista como um horizonte de oportunidades para inovação e geração de negócios: “Podemos ser líderes mundiais na produção de bioenergia e em inovação verde, desde que a carga tributária e os impactos positivos das organizações estejam relacionados”. O executo acredita que transformar as vantagens naturais do Brasil em vantagens competitivas globais é um desafio que precisa ser assumido pelo Estado, pela indústria e pelas universidades e centros de pesquisa do país.

Segundo o representante da Natura, o Brasil precisa evoluir em três questões fundamentais: facilitar o acesso de pesquisadores ao nosso patrimônio genético; ter um marco regulatório que garanta direitos e forneça segurança para transformar conhecimento em riqueza; etualizar a Lei de Propriedade Industrial para garantir a proteção de produtos biotecnológicos, inventos relacionados a organismos vivos ou resultantes da sua manipulação.

Pedro Passos também falou sobre a importância da educação para o fortalecimento da bioeconomia no Brasil, defendendo que o país que é a 6ª economia do mundo precisa estar entre os 10 países de melhor nível educacional do mundo nos próximos 20 anos. “É o mínimo para garantir a inteligência que precisamos para conduzir de forma ousada e coerente a exploração do nosso patrimônio genético”, concluiu.

Fórum de Bioeconomia CNI-Harvard

O evento acontece em São Paulo e é a primeira discussão multissetorial e de âmbito internacional no país sobre o assunto. Acompanhe a cobertura completa no site da CNI e no blog de propriedade intelectual da instituição.

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