Mesmo na crise é preciso explorar as janelas de oportunidade

Há janelas mais fáceis de serem implementadas, que precisam ser aproveitadas

A crise é profunda e impõe ações contra o imobilismo. Há temas da agenda de saída da crise que são complexos e que dependem de uma concertação mais ampla. Mas há janelas, mais fáceis de serem implementadas, que precisam ser aproveitadas. A necessária e urgente correção fiscal precisa vir acompanhada de ações focadas na melhoria da competitividade da economia brasileira. A agenda da competitividade não rivaliza com o ajuste fiscal. É possível, ou melhor, é imperativo que ambas caminhem paralelamente. Só assim o crescimento retornará mais rapidamente e de maneira sustentável. 

Com essa perspectiva, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou o documento, Regulação e Desburocratização: propostas para melhoria do ambiente de negócios , recentemente objeto de uma avaliação pelo Ministério da Fazenda, tendo como premissas as necessidades de ajuste fiscal e de aumento da competitividade. São medidas, em sua maioria, de baixo impacto fiscal. As principais oportunidades de ação estão em tributação, melhorias na infraestrutura, modernização das relações de trabalho e comércio exterior. E, como pano de fundo, a necessidade de ações voltada para aumentar a segurança jurídica dos investidores. 

O fato é que mesmo em um ambiente marcado por demanda em queda há restrições ao investimento que derivam de questões regulatórias que inibem a oferta. Há muitos casos em que o investidor está disposto a assumir riscos, mas não o faz por conta da qualidade regulatória ou de incertezas jurídicas. É possível listar oportunidades de ampliação de investimentos em áreas como Petróleo e gás com mudanças no papel da Petrobrás no pré-sal, na ampliação da exploração de gás on shore com novos marcos regulatórios, na expansão em cosméticos, química verde e farmacêutica com a regulamentação da lei da biodiversidade, em reflorestamento e agronegócio com a regularização das compras de terras por estrangeiros. O mesmo pode ser dito em relação a áreas de infraestrutura, petroquímica e economia digital ou até mesmo para os negócios em geral e, em particular, para o venture risk capital, por conta da insegurança que nasce da desconsideração da pessoa jurídica. 


Ainda na área regulatória é possível avançar em direção à qualidade regulatória. Um primeiro passo poderia ser uma trégua sobre iniciativas regulatórias que venham implicar em elevação de custos expressivos para as empresas. Um torniquete sobre essas iniciativas seria oportuno. Em alguns países europeus há mecanismos de controle que nascem das avaliações custo-benefício e da concentração dos anúncios regulatórios em apenas um dia do ano. Na área de relações do trabalho, a NR12 é uma candidata natural. O fato é que as empresas vivem entre dois mundos: o da hipernomia (excesso de regras) e o da anomia (falta de regras). Neste último caso, a terceirização merece atenção. 

Há outros passos um pouco mais complexos na área tributária. É preciso simplificar o modelo tributário para eliminar seus efeitos negativos sobre a competitividade, como a cumulatividade de cobranças de impostos. A substituição do conceito de crédito físico pelo crédito financeiro no âmbito do PIS-Cofins evitaria a cumulatividade hoje existente com o procedimento e beneficiaria as exportações. No entanto, mudanças na política tributária têm que ter como princípio a neutralidade em termos de carga tributária.

As concessões em infraestrutura representam mais do que uma oportunidade. A carência desses serviços, de fato, é impeditiva à competitividade do país, mas é também janela de negócios atrativa a capitais brasileiros e internacionais. No entanto, é imprescindível efetivar as concessões e parcerias público-privadas (PPPs). E não é difícil avançar nessa agenda, posto que já temos, de um modo geral, os marcos regulatórios necessários. 

É preciso vontade política e o reconhecimento do papel setor privado como parceiro no desenvolvimento do país, aperfeiçoar a execução dos modelos de outorga e os marcos regulatórios de maneira a melhorar as condições de execução dos investimentos e tornar as concessões atrativas e rentáveis. Atualmente, enquanto sobram regras muitas vezes confusas para alguns setores, faltam diretrizes básicas para outros. 

Neste cenário adverso não é razoável contar com uma recuperação baseada na reação do mercado consumidor interno. As exportações precisam ocupar um espaço prioritário e temos de abrir novos mercados no exterior. A valorização do dólar emerge como uma chance, especialmente para exportadores de manufaturados e oportunidades substitutivas, apesar da volatilidade do câmbio e do fato de que a desvalorização frente ao dólar não é prerrogativa exclusiva do real. 

É imprescindível aliviar o peso da burocracia que recai sobre as transações de comércio exterior. Priorizar a implantação do Acordo de Facilitação de Comércio, com a garantia dos recursos necessários, é fundamental par permitir a redução dos custos de transação das exportações e importações. Além disso, é preciso seguir os exemplos internacionais, manter o custo do financiamento externo competitivo e avançar nos acordos comerciais, a exemplo do México e EU MERCOSUL. 

O momento exige um sentido de urgência para essa agenda. É fundamental destravarmos todos os obstáculos, especialmente aqueles que seguram decisões de investimentos, oneram a produção e desestimulam a atividade industrial. Aproveitar o momento difícil para atacar a burocracia e ganhar qualidade regulatória é o caminho para facilitar uma travessia da recuperação com menores custos em termos de empregos e ativos do País.

O artigo foi publicado nesta quinta-feira (14) no jornal Valor Econômico.

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